Brasil ganha 1,1 milhão de idosos por ano

Brasil ganha 1,1 milhão de idosos por ano

Brasil jovem, país do futuro. Construído ao longo das últimas décadas, esse retrato do imaginário brasileiro começa a ser rapidamente desconstruído pelos números e projeções do envelhecimento da população, sem que todos os níveis do poder público e a sociedade se dêem conta do tamanho das mudanças que estão por vir. A cada ano, 1,1 milhão de brasileiros chegam aos 60 anos, fronteira para o início do envelhecimento. 

Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) das Nações Unidas indicam que, daqui a 40 anos, a população idosa brasileira vai aumentar em 45 milhões de pessoas, dos quais 15 milhões terão mais de 80 anos. Atualmente, apenas 2,8 milhões de brasileiros já passaram da casa dos 80. 

“É como se fosse uma Argentina inteira com mais de 60 anos. Ou um Chile com mais de 80”, resume Paulo Saad, chefe da Divisão de População da Cepal (Celade/Cepal). Essa mudança causa impacto nos sistemas de saúde e previdência e também nas próprias cidades. Nas grandes metrópoles, nem sequer o tempo de travessia de ruas nos semáforos é adequado aos pedestres, muito menos a quem se locomove de forma mais lenta. 

O envelhecimento da população brasileira é um fenômeno demográfico, mas também de longevidade. Com a redução da taxa de fecundidade e o nascimento de menos crianças, aumenta a proporção de adultos e idosos. Hoje, os idosos são 10,3% da população. Em 2050, serão 29%. Esse é o efeito demográfico. A longevidade, por sua vez, pode ser explicada pelos avanços na medicina e por práticas associadas à qualidade de vida, como exercícios físicos e alimentação equilibrada. Segundo dados do Fundo de População das Nações Unidas, em 1980, a esperança de vida dos brasileiros ao nascer era de 63,4 anos. Chega hoje a 74. Em 2050, alcançará quase 80 (79,4). 

“Morrer hoje antes de 74 anos é uma morte prematura. A sociedade já compreende que tem condições de viver bem até essa idade”, afirma Dália Romero, pesquisadora do Laboratório de In¬¬formações em Saúde (LIS/ICICT/Fiocruz). “O problema é que ninguém está acostumado a falar em morte prematura de idoso”, diz a especialista. 

Dália acaba de desenvolver, numa parceria com o Ministério da Saúde, o Sistema de Indicadores de Saúde e Acompanhamento de Políticas do Idoso. O indicador, que será apresentado em outubro, dará às prefeituras de todo o país condições de monitorar políticas e programas que contemplem a saúde do idoso. 

A pesquisadora argumenta que é preciso melhorar o serviço de atenção básica à saúde do idoso, com campanhas específicas para a faixa etária. É possível viver mais, mas a meta é que esses anos além dos 60 sejam acompanhados de boa qualidade de vida. Em São Paulo, onde a população tem um perfil mais velho que o restante do país, uma pesquisa feita em 2008 mostrou que 5% das mortes de pessoas entre 60 e 74 anos estavam associadas ao tabagismo. Outras 29% foram provocadas a hipertensão e doenças associadas.

“Mortes por câncer na laringe e traquéia não seriam tantas se fossem feitos mais programas de vida saudável para a terceira idade. O acompanhamento da hipertensão, com campanhas específicas, poderia evitar mortes por insuficiência cardíaca”, explica. 

A mais conhecida das campanhas para idosos no Brasil é a vacinação contra a gripe. Para os especialistas, o país precisa urgentemente de novas campanhas de controle de doenças crônicas voltadas a esse público. 

País envelhecerá mais que o resto do mundo

Num futuro cada vez mais próximo, o Brasil terá de gastar mais tempo e dinheiro para administrar o envelhecimento do que o restante do mundo. As projeções do Fundo de População das Nações Unidas indicam que o Brasil não só deixará de ser jovem, mas terá um perfil mais velho que o da maioria dos demais países. Os números desta inversão surpreendem. Em 1980, a média de idade no Brasil era de 20,4 anos, para uma média mundial de 23,9 anos. Neste momento, estamos dentro da média, de 29,2 anos. Daqui a 39 anos, a população brasileira terá em média 44,9 anos, seis a mais do que a do resto do mundo, com média estimada em 37,9 anos. 

Na avaliação dos especialistas, o Brasil está envelhecendo em 30 anos o que a Europa demorou um século. Por isso, tem de pensar e agir com mais rapidez. Solange Kanso, do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), lembra que em 2040 o país terá 56,7 milhões de idosos. Em número absoluto, é mais que o dobro da quantidade atual. “Quem vai cuidar dessas pessoas?”, indaga Solange. 

Segundo dados do Ipea, 15% dos idosos precisam de algum tipo de ajuda nas atividades cotidianas, como comer e tomar banho. Porém, apenas 30% das cidades brasileiras têm instituições de longa permanência, o nome novo dos antigos asilos. A maioria delas é privada. Na última década, surgiram pelo menos 90 instituições desse tipo por ano no Brasil, mas são privadas. Na avaliação de Solange, elas ou são muito caras ou muito ruins. 

Na prática, a família é a principal responsável pelo cuidado com seus idosos. Se um idoso é deixado sozinho em casa, a família pode responder por abandono. O problema – mais um – é que as famílias também estão transformadas. Não há e não haverá tantos filhos para cuidar dos pais como antigamente. As mulheres, as “cuidadoras” por tradição, estão no mercado de trabalho, preocupadas em ganhar dinheiro. 

“Se não houver políticas públicas para o cuidado com idosos, o Brasil terá pessoas idosas cuidando de idosos mais velhos ainda”, diz Taís de Freitas Santos, representante auxiliar do Fundo de População das Nações Unidas no Brasil. 

(Portal G1)

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